Primeiro nos acorrentaram,
depois nos colocaram em um miserável porão de navio, passamos dias e dias tendo
nosso corpo rasgado pelas duras madeiras do chão, ouvindo apenas nosso estômago
e o nosso medo.
Atracamos no porto e fomos
levados, atrelados por nossos grilhões, meio
mortos, meio vivos, para aquela que seria a nossa primeira escola, uma senzala.
Ali recebemos um dos
muitos ensinamentos a que teríamos direito: a lei da chibata, os outros também
eram muito parecidos: “Não fale, você não tem voz.”, “Não reze, você não tem
alma.”, “Não olhe para cima, a liberdade não te pertence.”, “Não pense, porque
eu te proíbo.”, “Não sonhe, porque você não tem esse direito.”.
Centenas de anos se
passaram desde que a chibata deu lugar a pseudodemocracia em que vivemos. Hoje,
não moramos mais em senzalas, estabelecemos moradia nos morros das grandes
cidades; não transitamos mais pela casa grande, somos invisíveis limpando o
chão; não temos nossa carne cortada pelo couro curtido, mas amaciada pelas
conduções lotadas.
Não temos, não somos, não existimos!
Em nenhum momento nos
demos conta disso, porque jamais soubemos de fato a nossa história, abrimos mão
desse conhecimento em troca do estereótipo, deixamos que nos chamassem de favelados,
sem instrução, sem cultura, sem futuro.
Muitos de nós até sentem
orgulho de serem chamados por essa alcunha. O orgulho leva ao preconceito, o
preconceito à dominação e aí começa tudo de novo: orgulho, preconceito,
preconceito, dominação.
Felizmente, outros
resistem.
Em 9 de agosto desse ano,
2014, em Ferguson, Missouri (EUA), um adolescente negro foi assassinado por um
policial branco. Imediatamente seus “irmãos” se levantaram e foram às ruas
protestar e reacenderam as discussões sobre as questões raciais naquele país.
Atitude louvável, não?
Já aqui, isso é tão comum
que nem protestamos, apenas damos de ombros e nos lamentamos. Salvo, é claro, o
caso de Vinícius Romão, rapaz negro que foi confundido com um assaltante e
acabou indo parar na cadeia. O que alegaram? Ele parecia com a descrição dada
pela vítima sobre o seu algoz: negro, magro, cabelos crespos e olhos castanhos.
Ao que me consta essa descrição condiz com a de boa parte dos brasileiros.
Ir contra
uma imagem pré concebida não é fácil, anos de sedimentação deixaram-na bem
acomodada no pensamento de muitas pessoas. Quando uso o termo genérico
“pessoas”, não quer dizer que me refiro apenas aos que se consideram brancos, isso
seria patético! Falo dos negros, dos mestiços e dos índios, até porque o
preconceito não tem fronteiras raciais.
Lutar
contra o racismo é lutar a favor da união dos seres humanos, da humanidade, até
porque esse conceito ultrapassa a cor da pele.
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